Por Maurício Boff
No município goiano de Itumbiara, o povo cigano vive em situação de precariedade, sem acesso a direitos básicos. A ocupação informal em área pública, somada à falta de compreensão do poder público sobre a questão territorial cigana, resulta em condições de vida degradantes e discriminação. A comunidade cigana corresponde a cerca de 1% da população do município, ou em torno de mil pessoas. A maior parte delas mora em acampamentos de lona, sem energia elétrica, água tratada e esgoto e a frequência escolar de crianças e adolescentes é prejudicada pela ausência de meios adequados para a higiene pessoal antes das aulas.
Essa realidade começou a mudar a partir da inclusão da área ocupada pela comunidade cigana na Plataforma de Territórios Tradicionais, uma ferramenta digital inovadora que centraliza informações sobre territórios tradicionais do Brasil, possibilitando visibilidade e acesso a políticas públicas. A iniciativa é resultado da parceria entre o Ministério Público Federal (MPF) e o Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais (CNPT), com apoio da Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável. A inclusão dos dados na Plataforma surgiu do diálogo entre a comunidade cigana e o MPF, em oficina realizada pelo projeto Territórios Vivos. A partir daí, o grupo passou a compreender que o território é o ponto de partida para a garantia de seus direitos fundamentais. A mobilização da comunidade e o apoio do MPF sensibilizaram o poder público para a construção de uma solução mais efetiva para a vida cigana no município.
O MPF desempenhou um papel fundamental ao recomendar à prefeitura da cidade a criação de uma política pública capaz de atender às necessidades da comunidade cigana. Provocada, a administração pública municipal de Itumbiara reconheceu a reivindicação da comunidade cigana por um território que garanta o modo de vida tradicional e a dignidade do grupo. Um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi assinado em março de 2023 e um projeto de lei foi aprovado em seguida pela Câmara Municipal, em maio do mesmo ano. A prefeitura agora trabalha para concluir a distribuição de lotes com infraestrutura urbana adequada para a comunidade.
A ocupação precária de áreas públicas pela comunidade, que perdura há mais de 50 anos, dará lugar a um autêntico território cigano, devidamente reconhecido e regularizado pelo poder público. O projeto Territórios Vivos desempenha um papel vital na compreensão da questão territorial cigana no Brasil, ajudando a evidenciar o valor de tradições, língua, modo de vida e cosmovisão próprias do povo cigano. O desfecho positivo do caso de Itumbiara/GO abre novas possibilidades para a promoção de direitos de ciganas e ciganos no Brasil.
Projetos: Territórios Vivos (Agenda 2030 – contribuição para o princípio leave no one behind)
Parceiros: Ministério Público Federal (MPF) e Rede de Povos e Comunidades Tradicionais
Financiador: Ministério da Cooperação Econômica e do Desenvolvimento (BMZ) da Alemanha por meio da Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) GmbH